sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Os custos a que o estado obriga uma pequena empresa

É com enorme satisfação que observo uma crescente procura do blog fora de Portugal.
No top do ranking, para além de Portugal, está hoje o Brasil seguido de muito próximo pelos EUA. No entanto o blog já é lido em 9 países para além de Portugal, espalhados por 4 continentes!

Um tema recorrente que trás leitores internacionais a páginas de Portugal é: quais os encargos imputados pelo estado às pequenas empresas, quer seja por via fiscal, quer seja por via de taxas, quer seja por via de custos derivados de obrigações legais/regulamentares.

É de facto uma reflexão muito interessante, e ainda não li nenhum artigo em que alguém fizesse uma análise integrada a uma empresa e apresentasse estas contas. Por isso, decidi-me a fazer eu próprio este exercício, usando as minhas empresas como caso de estudo.

Neste post apresentarei:
   1 - quais os encargos com o trabalho imputados pela legislação laboral (fiscais e não fiscais);
   2 - quais os encargos regulamentares, relacionados com o licenciamento da actividade (fiscais e não fiscais);
   3 - quais os encargos fiscais directos (IVA, IRC, PEC, ...);
   4 - ...

Face à extensão da análise, e face ao meu objectivo de ser tão exaustivo quanto possível, irei actualizar este post ao longo das próximas semanas, à medida em que for fazendo contas às diversas categorias, e indo de encontro às questões que entretanto me forem sendo colocadas. Também, face às medidas de austeridade anunciadas no orçamento de estado de Portugal para 2011, bem como a entrada prevista em vigor do nov código contributivo, tentarei fazer uma análise do que tal significa em termos de alterações face à realidade de 2010.

Assim, este post estará vivo ao longo dos próximos meses, sofrendo actualizações tão frequentemente quanto possível.



1 - quais os encargos com o trabalho imputados pela legislação laboral (fiscais e não fiscais);


Para começar, o ponto mais simples. Os encargos laborais.
Vou dividir aqui em 2 grupos:
   - encargos suportados pela empresa;
   - encargos suportados pelo trabalhador.
 
Os encargos básicos suportados pela empresa, por ter um trabalhador ao seu serviço, são os seguintes:
   - Taxa Social Única, aplicável sobre o rendimento bruto sujeito a retenção na fonte:
      - trabalhadores 23,75%;
      - gerentes 21,25%.
      NOTA: é isento de retenção na fonte subsídio de refeição ou de transporte até aos limites legais.
   - Seguro de acidentes de trabalho: para todas as pessoas ao serviço da empresa;
      - pode rondar 1% dos rendimentos globais a segurar;
   - Formação e auditoria de higiene e segurança no trabalho (obrigatório para empresas com mais de X trabalhadores);
      - pode rondar os 150 Euros / ano
   - medicina no trabalho (obrigatório para empresas com mais de X trabalhadores);
      - pode rondar os 30 a 40 Euros / pessoa / ano;
   - formação profissional;
      - obrigatório dar 35 horas / ano / trabalhador, de formação acreditada;
   - remuneração de faltas conforme legislação:
      - casamento, nascimento de filho, óbito de familiar directo, deslocação a tribunal, entre outras, são exemplos de ausências a que o trabalhador legalmente tem direito, sem perda de remuneração. Verificar a actualização do código do trabalho de 2009 para verificar este tema em detalhe;
   - férias, subsídio de férias e subsídio de natal:
      - o trabalhador tem direito a 2 dias de férias por cada mês trabalhado, podendo chegar a 25 caso não tenha ausências no ano anterior. No caso das ausências ao trabalho pelos motivos previstos na lei, embora possa não haver direito ao recebimento de remuneração, continua a ganhar-se direito aos dias de férias correspondentes aos dias de ausência;
      - o trabalhador tem direito a subsídio de férias no valor correspondente a 2 dias de trabalho, por cada mês trabalhado na empresa (13º mês de salário);
      - o trabalhador tem direito a subsídio de natal no valor correspondente a 2 dias de trabalho, por cada mês trabalhado na empresa (14º mês de salário);
      - o trabalhador tem direito a 2 dias de folga por semana, podendo ser calculados em termos médios;
      - o trabalhador tem direito a um período de pausa ao fim de cada período contínuo de trabalho de duração máxima de 5 horas;
      - o horário normal de trabalho em Portugal é de 40 horas por semana.
 
NOTA: este resumo não é exaustivo, pelo que para mais detalhe se recomenda a leitura integral do código do trabalho no site da Direcção Geral do Emprego e das Relações de Trabalho: http://www.dgert.mtss.gov.pt/trabalho/trabalho_p.htm
 
Refiro todos este pontos, pois eles efectivamente acabam por representar custos, directos ou indirectos, por exemplo colocando limitações à organização dos horários de trabalho, obrigando à contratação de mais pessoas.
 
 
Os encargos básicos suportados pelo trabalhador, fruto de obter um rendimento de trabalho dependente de uma empresa, são os seguintes:

   - Taxa Social Única, aplicável sobre o rendimento bruto sujeito a retenção na fonte:

      - trabalhadores 11%;
      - gerentes 10%.
      NOTA: este valor acresce ao valor já suportado pela empresa, e é abatido ao rendimento bruto atribuido ao trabalhador.
   - Retenção na fonte de IRS:
      - existem múltiplas tabelas de retenção na fonte do imposto sobre o rendimento (IRS), consoante o trabalhador é solteiro ou casado, etc. Anualmente o governo publica as tabelas de retenção na fonte, definindo qual a percentagem do rendimento bruto que deve ser retido pela empresa e entregue ao estado.

Pode-se resumir que, entre os custos suportados pela empresa e suportados pelo trabalhador, num cenário em que a empresa não dá quaisquer benefícios, cumprindo apenas as suas obrigações legais, o custo total por hora trabalhada, é sempre superior em pelo menos 50%, relativamente ao rendimento líquido recebido pelo trabalhador, podendo facilmente chegar aos 75% se considerarmos os custos de formação, ausências, etc.

Para já vou ficar por aqui, agradecendo desde já as vossas perguntas e feedback, e comprometendo-me a tão breve quando possível actualizar este post, seja para corrigir alguma informação, seja para acrescentar as contas relativas aos restantes pontos de custos legais, fiscais e regulamentares.

Abraço!
Angatu (Pseudónimo)

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Como escolher um franchising: Parte 2

Após o meu post de Janeiro de 2010 sobre lições aprendidas na escolha de um franchising (ver: Como escolher um franchising: Lições aprendidas), seguiram-se muitas conversas com amigos que me deram novas e importantes perspectivas sobre a selecção de um franchising.

Entre as conversas, surgiram os seguintes pontos:
   1 - o meu primeiro franchising/empresa vs segundas experiências e estratégias de crescimento;
   2 - estar no negócio como investidor vs estar como gerente operacional;
   3 - pequeno investimento vs grande investimento;
   4 - negócios de alta volatilidade vs negócios de baixa volatilidade;
   5 - negócios de impulso vs negócios de base instalada.

Neste post vou apenas abordar o ponto 1, e deixarei os seguintes para posts seguintes.

1: O meu primeiro franchising/empresa vs segundas experiências e estratégias de crescimento.

No post Franchising e Legislação de Maio de 2010, falei muito sobre a "ignorância" dos novos franchisados.
De facto, ser director numa grande empresa, e ter uma carreira de sucesso como gestor em grandes empresas, ou ser um técnico altamente especializado na área em que vamos comprar o franchising, não nos prepara completamente para ser um pequeno empresário.
Um amigo dizia-me um dia destes: "na grande empresa, treinam o gestor para se afastar da operação, para delegar, para gerir por KPIs, para retirar a barriga do balção e ter perspectiva, mas na pequena empresa, sobretudo na fase de arranque ou em momentos que a empresa passe por dificuldades, não há melhor solução que o proprietário encostar o umbigo no balcão".

Com isto ele falou de aspectos como o facto de na grande empresa haver uma equipa de gestão, multidisciplinar, em que o gestor têm um âmbito de intervenção bastante limitado, não tendo necessidade de ser conhecedor em detalhe de todas as áreas como sejam marketing, vendas, legal, finanças, operações, etc.
Associado ao ponto anterior, há também o facto de o gestor na grande empresa ter habitualmente uma equipa operacional qualificada em cada uma das áreas, pelo que o seu trabalho passa muito por coordenar as diversas áreas e orientar toda a equipa aos objectivos estratégicos da empresa, ou até de repensar a estratégia da empresa em face de mudanças no mercado, mas tende a afastar-se da execução.

Ora na pequena empresa, não há capacidade financeira para toda esta estrutura. E em termos de recursos humanos, há muitas vezes que assumir compromissos. Ou seja, não há capacidade para ter a equipa ideal, pelo que se opta muitas vezes por integrar elementos jovens normalmente mais polivalentes mas que têm que ser desenvolvidos, com elementos mais experientes normalmente menos flexíveis e com menor capacidade de desenvolvimento.

Em qualquer caso, tem que ser o proprietário (gestor operacional) a desenvolver essa equipa, pois não é fácil encontrar um negócio em franchising ou com capacidade financeira para pagar um gestor operacional de primeira linha, ou com um processo formativo suficiente para preparar um gestor (não proprietário) de forma adequada à correcta gestão do negócio. É portanto muitas vezes necessário o gestor, mais que estar próximo da operação (ler o post: O que faz um gestor operacional), por vezes até participar e executrar na operação.

Daí, numa primeira experiência, é muitas vezes conveniente que seja o proprietário a gerir o negócio, mesmo que o seu objectivo seja assumir uma situação de investidor com múltiplas operações em diversos sectores de actividade. Quanto mais não seja, esta primeira experiência, forçará o gestor (sobretudo aqueles provenientes de grandes empresas) a entrar no espírito da pequena empresa.

Um outro amigo dizia-me: gerir uma pequena empresa e uma grande empresa é quase igual, mas com uma grande pequena diferença:
   - na grande empresa, há sempre alguém com dinheiro suficiente para pagar o custo dos erros de gestão que alguém possa cometer, e que tem como consequência para quem os comete - no limite - o despedimento;
  - na pequena empresa, é o dono que paga esse preço, pelo que considerando que no contexto do franchising proliferam pequenas empresas de propriedade de pequenos investidores com capacidade financeira limitada, o distanciamento logo no primeiro projecto, associado ao deixar nas mãos de outro a aprendizagem e consequentemente uma capacidade de resposta mais lenta (doi sempre mais quando uma decisão pesa directamente no nosso bolso), pode ser fatal.

Se procurarem na internet, são multiplos os testemunhos que falam sobre as imensas aprendisagens da criação de uma primeira empresa. A primeira experiência empresarial é de uma riqueza única, e muito mais valiosa, e menos dolorosa para o bolso, se estivermos lá pessoalmente, mesmo que o caminho seja progressivamente abandonar esse papel.

Daí, aconselharia a que se vai entrar na sua primeira experiência empresarial, avalie bem a sua capacidade financeira e os seus objectivos. Deixe uma folga financeira adicional ao que lhe recomende qualquer franchisador, e tente entrar com mais capitais próprios que o "mínimo recomendado". Se optar por não estar à frente desse seu primeiro negócio, multiplique essas necessidades financeiras por dois.

Resumindo: se é a sua primeira experiência entre com capitais próprios com folga substancial, e se não ficar a gerir esse negócio, multiplique essa folga (ou factor de cagaço) por dois.

Daí diría que, é igualmente difícil a transição do técnico altamente qualificado que para a gerente na criação da sua própria empresa, como a transição do gestor de carreira em grande empresa para gestor "de umbigo no balcão" na pequena empresa.

Passando por esta primeira experiência, é muito mais provável que o gestor desenvolva a capacidade de treinar novos gestores operacionais, para que caso a sua estratégia passe por abrir novos negócios, assegure que os novos projectos não vão enfermar dos erros que ele próprio cometeu no primeiro, bem como que os gestores por si recrutados executem a função de gestor operacional à altura das expectativas do proprietário.

No entanto alerto, efectivamente, passado quase um ano desde que escrevi o meu primeiro post sobre como escolher um franchising, seja por via do modelo financeiro pensado para que a margem do negócio seja o salário do gestor/proprietário, seja por processos de formação ineficazes ou insuficientes, é raro encontrar hoje em Portugal um negócio que se adeque a um perfil de investidor, sobretudo se esta for a sua primeira experiência empresarial.
Tudo isto se torna mais real num contexto económico recessivo como o que actualmente se vive em Portugal, em que a probabilidade de se conseguirem atingir os resultados previstos nos planos de negócios dos franchisadores, se reduz dramaticamente.

O erro típico do gestor de multinacional (também nas palavras de um amigo): na multinacional, primeiro cria-se a estrutura para que posteriormente se desenvolvam as receitas; na pequena empresa, essa criação de estrutura, se for acompanhada com níveis de endividamento substanciais, pode sufocar a empresa perante as primeiras dificuldades e levá-la à morte.

Portanto, se é a sua primeira experiência de franchising, deixe uma margem grande para riscos inesperados! Evite ao máximo endividamento, planeie com mais cuidado as suas estratégias de saída, e considere seriamente a possibilidade de estar operacionalmente no seu negócio.

Se já teve a sua primeira experiência, e está a ler este post, das duas uma: ou a sua primeira experiência foi de sucesso e peço o seu contributo enviando-me um mail partilhando a sua experiência, ou se não correu bem e ainda não percebeu porquê, espero com este texto contribuir um pouco para que a sua próxima experiência seja muito mais bem sucedida.

Em breve, espero escrever sobre os outros pontos, no entanto desde já agradeço as sugestões, e incito aqueles que menos me conheçem a deixar as suas ideias aqui, no facebook ou por e-mail para angatu.guarini@gmail.com.

Abraço,
Angatu (Pseudónimo)

sábado, 6 de novembro de 2010

O custo da Justiça ao serviço dos incumpridores

Há iniciativas, que muitas vezes parecendo cheias de boas intenções, trazem escondido objectivos perniciosos.

Deparei-me recentemente com um exemplo, que me deixou pasmo.
Como sabem, sou engenheiro, pelo que o meu conhecimento do sistema legal/judicial é apenas superficial.

Bem, a situação: apenas recentemente me apercebi do que é um "tribunal arbitral", e o que isso significa, e quais as diferenças de um tribunal cível (comum).

Para aqueles que como eu eram ignorantes sobre este tema, concerteza já viram ser proposto em muitos contratos o "recurso à arbitragem", ou recurso ao "tribunal arbitral com recusa a qualquer outro". E provavelmente perante a pergunta que também eu fiz, sobre o que é isso, receberam a mesma resposta que eu: é uma alternativa ao sistema judicial comum, que permite resolver os casos mais rapidamente. Sendo assim, óptimo!

Pois em princípio é verdade, mas há um segundo aspecto que nunca ninguém me referiu, e que é o custo que estes tribunais implicam. Apenas recentemente me apercebi que um processo num tribunal arbitral, facilmente ultrapassa os 80.000 Euros!!! Sim, é isto mesmo! Quando num tribunal cível o custo do processo pode ficar por 10 ou 20 vezes menos. E aqui não estou a considerar os custos dos advogados!

Agora vamos olhar para esta particularidade do custo num contexto de franchising.

Vou dar um exemplo 100% fictício para exemplificar a situação. Imaginem a "D. Emília" que pretende ter o seu próprio negócio de costura e pequenos arranjos de roupa, e opta por um franchising na área. O investimento é de 40.000 Euros, dos quais a D. Emília tem 15.000, optando por financiar junto da banca os restantes 25.000. Na assinatura do contrato de franchising, tal como muitos franchisadores dizem, "temos que ter fé", e ela de boa fé assina o contrato que lhe foi apresentado, e dito não ser sujeito a negociações.

Perante a apresentação feita, por senhores com slides muito bem construidos, brochuras e planos de negócios com aspecto muito profissional, a D. Emília pensa para ela: pareceu-me tudo tão bem, foram tão simpáticos, e um advogado é tão caro... olha vou acreditar neles e assinar o contrato que me apresentaram.

Nesse contrato vem a seguinte particularidade: todos os diferendos relacionados com a interpretação do contrato ou com o papel das partes serão tratados em tribunal arbitral, excepto temas relacionados com cobranças dos valores devidos pelo franchisado ao franchisador, caso em que caberá ao franchisador a escolha do tribunal.

Bem, não sendo bem este o texto, pois estou a descrever uma situação 100% fictícia, o objectivo texto escrito no contrato era o seguinte: em todos os temas que possam ser de interesse do franchisado, recorrerá-se à arbitragem, e nos de interesse exclusivo do franchisador, poderá recorrer-se a um tribunal comum.

Claro que perante dezenas de páginas de clausulado e artigos, a D. Emília nem entendeu bem o impacto desta clausula, a qual também lhe foi expolicada resumidamente conforme já referi, sem qualquer alusão aos custos envolvidos.

Agora vejam esta situação: o franchisador logo desde início toma uma postura abusiva e ilegal perante a D. Emília, forçando sobrecustos de cerca de 500 Euros / mês, levando o negócio da D. Emília para um nível de rentabilidade mínima. Perante as reclamações da D. Emília de que isto não foi o acordado, o franchisador responde com ameaças e palavras duras, sustentadas numa interpretação tendenciosa sua do texto do contrato. Perante o desespero da situação, a D. Emília lá decide finalmente procurar um advogado para tentar resolver a questão via judicial.

Quando reune com o advogado este informaã de que para discutir esta questão num tribunal arbitral, poderá incorrer em custos de mais de 60.000 Euros.......

Ora se a D. Emília mal conseguiu 15.000 Euros para abrir a empresa, como é que algum dia ela conseguirá 60.000 para um processo judicial num tribunal arbitral???

E assim, a justiça torna-se um recurso da parte mais forte. O franchisador, como parte mais informada e mais capaz financeiramente, conseguiu que nenhum dos seus franchisados consiga algum dia colocar-lhe uma acção. Ele sabe que pode fazer o que bem entender, que nunca terá um caso em tribunal.

A legislação nacional e o nosso sistema de justiça, prestam desta forma um excelente serviço aos franchisadores incumpridores.

Esta era uma ideia que nunca me tinha passado pela cabeça, mas mais uma vez, aqui se confirma a má fé de muitos franchisadores em Portugal. E por isso, defendo que deveria haver rapidamente o desenvolvimento de legislação específica para o franchising em Portugal, por forma a que a parte mais fraca nestas relações (o franchisado) possa ser convenientemente defendido.

Portanto, se assinar um contrato de franquia em Portugal, esteja atento! E não assine nada sem ser convenientemente aconselhado por um bom advogado.

Termino com mais uma daquelas frases célebres que ouvi certo dia: qualquer burlão de sucesso é credível. Se não fosse, não conseguiría burlar ninguém! Por isso, se lhe apresentarem o negócio do século, só cheio de vantagens, mas com alguns pequenos pontos que lhe deixam dúvidas, mas que não são sujeitos a negociação, ou com contratos que não estão abertos a alterações de qualquer tipo, desconfie...

Pelo menos, neste ponto da "arbitragem", se leu este post, já não tem razão para cair na armadilha.

Senhores legisladores e responsáveis pelo sistema judicial em Portugal: com esta particularidade, estão a conseguir que dezenas de famílias percam tudo o que têm em esquemas de franchising que são verdadeiras burlas, crescendo a coberto deste e outros buracos que o enquadramento legal português permite. Por isso, muitos deles quando tentam internacionalizar-se para mercados menos ineficientes que o Português, não têm sucesso.

Para mais ideias, sugiro a leitura dos posts Condições de saída em contratos de franchising e Legislação Portuguesa quando o franchising corre mal.

Abraço!

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Obrigações do trabalhador

Já por mais de uma vez me vi numa situação, de ter um trabalhador de uma das minhas empresas com maus desempenho ou comportamento, porque "não gostava do modo como lhe falávam" ou "não concordava com as regras de funcionamento da empresa".

Muitas vezes, os gestores e proprietários de pequenas empresas, sobretudo aqueles mais sensíveis à importancia de desenvolver e reter o capital humano, vêm-se no stress de não saber como lidar com estas situações, porque querem manter os trabalhadores motivados e satisfeitos.

No entanto, há que lembrar que a satisfação dos trabalhadores só pode ser um objectivo, se na relação trabalhador-empregador estiverem cumpridos os mínimos exigíveis na relação laboral. E em meu entendimento esses mínimos são:
  - o colaborador demonstrar destreza nas competências técnicas necessárias a um adequado desempenho da função;
  - o colaborador desempenhar regularmente na sua função, cumprindo os objectivos da empresa;
  - se o colaborador demonstrar respeito pelas regras da empresa e pela sua hierarquia;
  - se o colaborador demonstrar um padrão de conduta adequado à sua função, e em alinhamento com os valores base da empresa.

Infelizmente, muitos trabalhadores em portugal pensam que as suas obrigações se resumem a dar as horas definidas à empresa, e ir fazendo "mais ou menos" aquilo que lhe pedem.

Ou seja, em oposto, se eu tiver uma pessoa que demonstra uma boa atitude perante o ambiente de trabalho, e desempenha a sua função com sucesso, eu vou mais é querer manter a pessoa ao meu serviço, pois a empresa precisa de pessoas para funcionar. Aí então, há que trabalhar nos restantes aspectos da motivação do trabalhador, procurando responder aos anseios específicos e ancoras de motivação de cada um.

Não se pode querer pôr prioridade na motivação de alguém que não cumpre os mínimos para estar na empresa. Ou seja, a pessoa tem que querer estar na empresa, tem que ter competência para a função e tem que merecer estar na empresa.

Começar logo com muitos miminhos, muita flexibilidade, muitos agrados com colaboradores, sem que eles tenham primeiro demonstrado suficientemente e de forma sustentada ao longo de um período razoável as suas competências técnicas e comportamentais, pode fazer deixar passar de uma avaliação que deve ser objectiva e rigorosa um colaborador cuja a atitude é negativa e prejudicial ao desempenho global do grupo em que está inserido.

Assim, motivar os trabalhadores, é algo que vai mais além das obrigações básicas de uma relação laboral, na qual se paga pelo desempenho de uma função. Razão pelo que só faz sentido ir mais além, na medida em que também o colaborador esteja disponível e interessado em ir mais além na empresa, lutando pelo colectivo e pelo sucesso, fazendo ele próprio também parte desse sucesso.

Portanto, quando logo de início temos um colaborador com muitas questões e condições, e gosto disto mas não gosto daquilo, só faço de me falarem como eu gosto, e me deixarem fazer as coisas à minha maneira... estamos perante sinais evidentes de que se tivermos que passar por momentos difíceis na empresa, provavelmente não poderemos contar com esta pessoa, pois à primeira repreensão, à primeira adversidade, teremos um revoltado a boicotar o sucesso do grupo.

Os sinais vêm-se logo nos primeiros dias, e a minha máxima é: cabe a cada um escolher a sua atitude, e cabe-me a mim escolher que atitude quero na minha empresa.

No meu caso escolhi: quero pessoas com atitude positiva, que olhem para as questões como oportunidades, e que não passem os dias sempre a olhar com desconfiança para tudo, numa postura de que o mundo se uniu para o tramar, enfim... de que para ele o copo estará sempre meio vazio. Nunca estará bem, nunca terá um desempenho excelente, e desfocará o seu gestor da fotografia global provocando deste modo um desempenho sub-optimo da sua organização.

Termino com uma frase que ouvi a um conhecido treinador de futebol, quando lhe perguntaram porque retirou da equipa um certo jogador considerado por muitos como uma estrela.

Dizia ele: "eu prefiro um céu estrelado, a uma estrela muito brilhante. Sobretudo porque normalmente as estrelas mais brilhantes, são as estrelas cadentes". Não sendo estas as palavras exactas, era este o significado, e o seu autor Luíz Felipe Scolari.

Portanto advogo, que do lado do empregador numa fase inicial tem que haver clareza e um comportamento recto, e assim passar para o colaborador a escolha livre de que atitude quer ter. Perante a escolha do colaborador de ter uma má atitude, há que dar feedback objectivo rapidamente no sentido de realinhar a atitude e o comportamento do colaborador. Se perante esta chamada de atenção, a opção do colaborador for por acentuar um comportamento negativo, então provavelmente ele não tem espaço naquele grupo de trabalho.

Sugiro a leitura do post Confiança, e o sucesso empresarial, para uma melhor avaliação e alinhamento sobre o que é um comportamento correcto do gestor.

Abraço a todos!

Lei da Oferta e da Procura e a subida do IVA

Muito se tem falado sobre a inevitabilidade das subidas de impostos anunciadas, e infelizmente tenho que concordar que o descaso que tem pairado sobre a gestão do bem público, nos conduziu a esta infeliz inevitabilidade.

Nenhuma casa de família pode viver constantemente gastando "um pouquinho" mais que aquilo que ganha. Inevitavelmente um dia encontrará uma parede pela frente, pois ou deixa de ter dinheiro para pagar as contas, ou deixa de ter quem lhe empreste para continuar a gastar mais que ganha. Este deveria ser por regra o princípio da gestão do bem público. Eu quando não tenho dinheiro para jantar fora, como em casa. Se fazemos isto com o nosso dinheiro, deveriamos ter ainda mais cuidados quando gerimos bens alheios. Por isto não se verificar, se ouve tanto que faltam verdadeiros servidores públicos, daqueles que colocam o bem comum acima do seu bem pessoal, na certeza que o bem comum também os beneficiará no médio/longo prazo.

Isto não aconteceu em Portugal nos últimos anos, e vemo-nos obrigados a espremer todos os tostões que o país poder dispensar para alimentar este descontrolo de muitos anos.

Mas perante esta inevitabilidade, há opções que podem ser feitas: onde se sobem os impostos ou onde se corta a despesa.

Vou dar o meu exemplo para explicar os impactos das opções agora anunciadas para o orçamento de estado em 2011. Decidi em 2009 investir na criação de uma empresa, no sector da saúde e bem estar, na expectativa que este segmento apresentasse um crescimento mesmo num cenário de crise, e num cenário de IVA a 5%.

Perante esta situação fiz um plano de negócio, negociei financiamentos, analisei a viabilidade do projecto. O cenário era claramente positivo.

Desde Outubro de 2009 até hoje, o IVA subiu para 6%, o crescimento da economia tão anunciado no primeiro trimestre de 2010 verificou-se pontual e sem impacto na vida das familias, espera-se uma retoma da subida dos juros face às maiores economias europeias já estarem a recuperar, e cá o desemprego continua a subir, o rendimento das familias a caír a pique, a confiança dos consumidores em queda livre...

E no meio de tudo isto, para que já me tinha preparado (temos que preparar sempre um cenário adverso nas nossas análises de decisões de investimento), houve agora uma surpresa para que não estava de todo preparado. Subida do IVA aplicável a esta empresa de 6% para 23%.

Porque é que isto é grave? Quem conhecer um pouco da lei da oferta e da procura (http://en.wikipedia.org/wiki/Supply_and_demand), sabe que na medida em que os preços sobem, há cada vez menos consumidores disponíveis para consumir o produto. Assim, considerando que o negócio está numa fase estável, mas com baixa rentabilidade derivado das actuais condições de mercado, sendo recente ainda tem muita dívida para amortizar, uma subida do IVA de 6% para 23% provocará um de dois cenários:
  - ou subimos os preços para reflectir este aumento de IVA, e baixamos a facturação por erosão da base de clientes, e a empresa caminha para a ruptura;
  - ou mantemos o preço absorvendo o impacto do IVA e um negócio que hoje é rentável, passará por decreto governamental a dar prejuizo em Janeiro de 2011.

Em qualquer cenário, a expectativa é que o negócio caminhe para a ruptura.

Esta mudança violenta de regras, perante um negócio tão recente, é fatal, e levará inevitavelmente centenas de empresas afectadas por esta mudança à ruptura, sobretudo as mais jovens, que também estarão mais pressionadas pela subida dos juros esperada para 2011.

Ouvi a muitos, que quando o IVA baixou para algumas destas actividades à alguns anos atrás, tal não se reflectiu na descida dos preços das empresas instaladas a essa data.

Pois é verdade, mas também é verdade que se tal descida não tivesse ocorrido, não teriam surgido tantos concorrentes, com modelos de negócio mais optimizados e abrindo em localizações que no cenário anterior seriam inviáveis, com preços mais reduzidos, e levando esta oferta a mais segmentos do mercado e a mais regiões do país.

Estamos a falar de desporto. Sim, fitness, saúde e bem estar. Actividade física. Ou seja, se seguem o novo programa da SIC Mulher (passo a publicidade) "The Biggest Looser", quanto mais não seja, já conseguiram perceber os inúmeros benefícios da prática do exercício físico, bem como o contributo que esta pode dar na redução de doenças, e consumos nos serviços públicos de saúde.

Com esta mudança, centenas de pequenos investidores perderão tudo, pois empenharam aos bancos tudo o que tinham para ter o seu próprio negócio, e ter uma actividade física voltará a ser um luxo de algumas elites mais abastadas.

Que subam os impostos, de acordo. Mas em alinhamento com o esforço de todos os outros sectores, não mudando assim radicalmente as regras.

É injusto e penalizador de jovens empreendedores, que fizeram a opção de criar emprego neste contexto tão difícil que temos vindo a viver nestes últimos 2 anos.

É lamentável que seja o estado por decreto a provocar a ruína de pequenos negócios que hoje são viáveis. Não há que queixar do mercado, nem da concorrencia. Quem faça de forma séria um plano de negócio nos dias de hoje, tem que se preparar para tudo isso. Mas algo que ninguém consegue antever, é uma mudança das regras do jogo desta envergadura, que é algo que retira a confiança dos investidores, razão pela qual habitualmente os estados evitam mudanças de regras tão profundas sem que haja um debate prévio alargado que permita aos afectados adaptar-se.

Alguns pequenos empresários que conheço ainda têm esperança de conseguir acomodar este sobrecusto que esta mudança de IVA representará. Provavelmente terão que reduzir postos de trabalho, espremer os fornecedores, tentar renegociar com todos os parceiros as condições de pagamento estendendo os seus prazos, para manter o negócio vivo e não incumprir com ninguém.

Mas sei que muitos morrerão, e acentuarão o descrédito na política hoje seguida no nosso país.

O estado hoje em Portugal comporta-se como aqueles bichinhos que: comem tudo, tudo, tudo... e não deixam nada, nada, nada...

Eu próprio, quando leio este post e leio de novo o que escrevi em:
  - O estado dos valores e da ética;
  - O estado e as entidades públicas para as pequenas empresas;
  - Franchising e Legislação
fico arrepiado com a imagem com que fico da realidade em que vive o pequeno empreendedor hoje em Portugal. É um verdadeiro filme de terror.

Há que aplaudir bravamente aqueles que nestas condições empreendem novos projectos e ainda demonstram confiança no futuro.