sexta-feira, 25 de junho de 2010

A legislação Portuguesa quando o Franchising corre mal

Ouvi certo dia a um advogado que muito estimo, que os contratos escritos servem sobretudo quando as relações correm mal, pois quando correm bem, as situações resolvem-se em diálogo são e construtivo entre as partes.
Do mesmo modo, deveria também ser esse também o papel da legislação, de proteger os direitos basicos das partes mais frágeis na relação contratual, bem como assegurar justiça e transparencia nas relações.

Neste contexto, olhemos ao franchising! Infelizmente, há cada vez mais histórias de experiências de franchising mal sucedidas em Portugal, e as que mais tomo conhecimento têm a ver com falta de preparação do franchisador, e/ou prestação de informação incompleta, insuficiente ou até falsa.

Face ao contexto em que muitos candidados recorrem ao franchising (para melhor contextualização ler o post de Maio Franchising e Legislação e o post de Janeiro Como escolher um franchising), é fundamental que a legislação seja clara neste aspecto, sobretudo para facilitar o trabalho de um Juíz num eventual processo judicial, em que muitas vezes não é facil perceber quem efectivamente tem razão.

Em Portugal, não existe uma lei base para os sistemas de franchising, algo já existente noutros países à muitos anos, estando a legislação dispersa pelas diversas áreas em que o franchising pela sua actividade entronca, como sejam o direito comercial, da concorrencia, da protecção dos dados pessoais, da propriedade industrial e intelectual, etc. Ou seja, alguém em Portugal para compreender o enquadramento legal do franchising, têm que conhecer profundamente praticamente tudo o que existe de legislação, no sentido de discernir o que pode ou não ser aplicável neste âmbito, e estando muitas vezes face à omissão, sujeito ao que foi ou será em casos específicos a interpretação do Juíz, a qual fará jurisprudência.

Ouvi números que apontavam para que o franchising represente em Portugal cerca de 6% do PIB. A ser este o número, é de facto bastante elevado, e merecia ter um enquadramento legal que lhe desse transparência.

Hoje a maioria dos casos de insucesso no franchising não chegam a tribunal, e tendo habitualmente o franchisador uma posição dominante, o fim de mutos desses casos de insucesso passam pela ruptura financeira do franchisado, em que conheço casos de pessoas que fecharam a actividade e ficaram anos a pagar as dívidas herdadas dessa má aposta.

Creio que ajudaria fazer algo semelhante ao que encontrei no Brasil, e que tomei a liberdade de transcrever aqui. Uma lei específica para o Franchising.

Fica a sugestão, para que os nossos deputados, que deveriam ter por missão representar-nos a todos, apresentem uma iniciativa legislativa no parlamento de criação de uma lei específica de enquadramento da actividade de franchising, integrando nela as especificidades neste momento distribuidas por todas as outras áreas legais. Creio que ajudaria a fazer com que esta componente da economia portuguesa, onde predominam micro e pequenas empresas, e que emprega pelo país inteiro (inclusive no interior), tivesse um papel ainda mais determinante na distribuição de riqueza e no equilibrio das actuais assimetrias norte/sul e litoral/interior.

Aqui fica a transcrição de parte da lei brasileira para o franchising (o texto integral em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8955.htm). 

Art. 1º Os contratos de franquia empresarial são disciplinados por esta lei.


Art. 2º Franquia empresarial é o sistema pelo qual um franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício.

Art. 3º Sempre que o franqueador tiver interesse na implantação de sistema de franquia empresarial, deverá fornecer ao interessado em tornar-se franqueado uma circular de oferta de franquia, por escrito e em linguagem clara e acessível, contendo obrigatoriamente as seguintes informações:

I - histórico resumido, forma societária e nome completo ou razão social do franqueador e de todas as empresas a que esteja diretamente ligado, bem como os respectivos nomes de fantasia e endereços;

II - balanços e demonstrações financeiras da empresa franqueadora relativos aos dois últimos exercícios;

III - indicação precisa de todas as pendências judiciais em que estejam envolvidos o franqueador, as empresas controladoras e titulares de marcas, patentes e direitos autorais relativos à operação, e seus subfranqueadores, questionando especificamente o sistema da franquia ou que possam diretamente vir a impossibilitar o funcionamento da franquia;

IV - descrição detalhada da franquia, descrição geral do negócio e das atividades que serão desempenhadas pelo franqueado;

V - perfil do franqueado ideal no que se refere a experiência anterior, nível de escolaridade e outras características que deve ter, obrigatória ou preferencialmente;

VI - requisitos quanto ao envolvimento direto do franqueado na operação e na administração do negócio;

VII - especificações quanto ao:

a) total estimado do investimento inicial necessário à aquisição, implantação e entrada em operação da franquia;
b) valor da taxa inicial de filiação ou taxa de franquia e de caução; e
c) valor estimado das instalações, equipamentos e do estoque inicial e suas condições de pagamento;

VIII - informações claras quanto a taxas periódicas e outros valores a serem pagos pelo franqueado ao franqueador ou a terceiros por este indicados, detalhando as respectivas bases de cálculo e o que as mesmas remuneram ou o fim a que se destinam, indicando, especificamente, o seguinte:

a) remuneração periódica pelo uso do sistema, da marca ou em troca dos serviços efetivamente prestados pelo franqueador ao franqueado (royalties);
b) aluguel de equipamentos ou ponto comercial;
c) taxa de publicidade ou semelhante;
d) seguro mínimo; e
e) outros valores devidos ao franqueador ou a terceiros que a ele sejam ligados;

IX - relação completa de todos os franqueados, subfranqueados e subfranqueadores da rede, bem como dos que se desligaram nos últimos doze meses, com nome, endereço e telefone;

X - em relação ao território, deve ser especificado o seguinte:

a) se é garantida ao franqueado exclusividade ou preferência sobre determinado território de atuação e, caso positivo, em que condições o faz; e
b) possibilidade de o franqueado realizar vendas ou prestar serviços fora de seu território ou realizar exportações;

XI - informações claras e detalhadas quanto à obrigação do franqueado de adquirir quaisquer bens, serviços ou insumos necessários à implantação, operação ou administração de sua franquia, apenas de fornecedores indicados e aprovados pelo franqueador, oferecendo ao franqueado relação completa desses fornecedores;

XII - indicação do que é efetivamente oferecido ao franqueado pelo franqueador, no que se refere a:

a) supervisão de rede;
b) serviços de orientação e outros prestados ao franqueado;
c) treinamento do franqueado, especificando duração, conteúdo e custos;
d) treinamento dos funcionários do franqueado;
e) manuais de franquia;
f) auxílio na análise e escolha do ponto onde será instalada a franquia; e
g) layout e padrões arquitetônicos nas instalações do franqueado;

XIII - situação perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial - (INPI) das marcas ou patentes cujo uso estará sendo autorizado pelo franqueador;
XIV - situação do franqueado, após a expiração do contrato de franquia, em relação a:
a) know how ou segredo de indústria a que venha a ter acesso em função da franquia; e
b) implantação de atividade concorrente da atividade do franqueador;
XV - modelo do contrato-padrão e, se for o caso, também do pré-contrato-padrão de franquia adotado pelo franqueador, com texto completo, inclusive dos respectivos anexos e prazo de validade.
Art. 4º A circular oferta de franquia deverá ser entregue ao candidato a franqueado no mínimo 10 (dez) dias antes da assinatura do contrato ou pré-contrato de franquia ou ainda do pagamento de qualquer tipo de taxa pelo franqueado ao franqueador ou a empresa ou pessoa ligada a este.
Parágrafo único. Na hipótese do não cumprimento do disposto no caput deste artigo, o franqueado poderá argüir a anulabilidade do contrato e exigir devolução de todas as quantias que já houver pago ao franqueador ou a terceiros por ele indicados, a título de taxa de filiação e royalties, devidamente corrigidas, pela variação da remuneração básica dos depósitos de poupança mais perdas e danos.
Art. 5º (VETADO).
Art. 6º O contrato de franquia deve ser sempre escrito e assinado na presença de 2 (duas) testemunhas e terá validade independentemente de ser levado a registro perante cartório ou órgão público.
Art. 7º A sanção prevista no parágrafo único do art. 4º desta lei aplica-se, também, ao franqueador que veicular informações falsas na sua circular de oferta de franquia, sem prejuízo das sanções penais cabíveis.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

O que faz um gestor operacional

Neste mundo das pequenas empresas de serviços e em particular do franchising, há aquela pessoa que é efectivamente responsável por manter uma unidade específica a funcionar, que está lá no dia-a-dia, que gere a equipa que executa o serviço ao cliente.


Em alguns casos essa pessoa é um dos sócios, mas muitas vezes são "gestores" contratados.

Sendo o sócio ou um gestor contratado, há um conjunto de coisas que eles têm que assegurar, e que surpreendentemente muitas vezes não é claro para quem ocupa esta posição.

Voltamos a uma frase que já muitas vezes repeti: "se não sabemos para onde vamos, como é que asseguramos lá chegar?". Se este gestor contratado, a que vou chamar "Gestor Operacional", não entender claramente o seu papel e as suas prioridades, como poderá ter sucesso?

Nestas pequenas empresas, muitas vezes o "patrão" é muito presente e interveniente, caso em que é ainda mais importante a clarificação do papel desta pessoa.

Há muitas ideias, mas como é meu hábito, eu prefiro simplificar em regras simples com 3 a 5 pontos.

Antes disso, porque lhe chamo "gestora operacional"?

No caso de uma pequena empresa, ou de um franchising (na verdade, tal como acontece com a generalidade das empresas), cabe ao gestor de primeira linha (aquele que lidera directamente a equipa que executa), assegurar que as peças sob sua responsabilidade funcionam, e que a sua unidade de comporta como um todo com resultados significativos. Ou seja, no mundo dos serviços, isto significa colocar em funcionamento uma operação (que se caracteriza por ser continua), e mantê-la em funcionamento, bem como alimentar um processo de melhoria contínua incremental.

Nesta função, ao contrário de outras funções de gestão, não se pede para pensar estratégia, para analisar o mercado, ou para fazer todas aquelas coisas que se pede a gestores de negócios ou gestores de projectos. Pede-se sobretudo que haja foco na operação!

Face à pequena dimensão de que estamos a falar, muitas vezes estes gestores têm que ser multifacetados, com todo o stress e ineficiências que tal implica. Mas há uma função core da qual todas as outras derivam, e que considero ser: manter a máquina a funcionar no seu óptimo.

Então em que se resume o trabalho desta pessoa?

Planear, organizar, dirigir e controlar.

Simples! Demais, não?

Claro que há muito mais, mas estas 4 coisas definem qual deve ser a sua hierarquia de prioridades quando começa o dia. Este gestor tem recursos ao seu dispor, com os quais deverá conseguir executar a missão da empresa, cumprindo a sua visão em alinhamento com os seus valores, e de acordo com os objectivos previamente estabelecidos com o seu superior hierárquico.

Então o primeiro passo passa por planear a alocação de recursos e actividades, conforme os objectivos definidos para a sua unidade.

Depois há que organizá-los. Definir o que cada um faz, qual a informação transitada, de quem recebe, a quem entrega, onde, quando, como.

Estando definido o caminho que se pretende trilhar (planear vs objectivos), e os passos e recursos para lá chegar (organizar recursos e tarefas), há que dirigir.

Cabe ao gestor operacional definir as prioridades, alterar as prioridades dos recursos, tomar decisões as decisões que afectem a execução do seu objectivo, bem como decidir sobre as eventualidades que apareçam no dia-a-dia da organização que provoquem uma alteração aos planos ou organização definidos.

É o gestor operacional que "manda" na operação. Se ele tem que ser responsável pelos resultados, tem que ser ele a decidir. Ninguém pode ser responsabilizado por algo que não decide, pelo que este é um dos pontos de mais conflito nas pequenas empresas, pois sendo os proprietários muito presentes, não entendem a separação de responsabilidades, acabando por muitas vezes mandar na área do gestor operacional, esvaziando assim muitas vezes o seu papel.

Se um proprietário decide colocar um gestor operacional numa unidade sua, tem que ter claro que o seu papel tem que evoluir. O proprietário deverá assumir o papel de um gestor de negócios e deixar o espaço de gestor operacional ao seu novo contratado. E isto leva à pergunta, mas afinal qual é o papel do gestor de negócios? De facto é por muitas vezes os pequenos empreendedores virem de funções de gestão operacional antes de se tornarem proprietários que faz com que comecem a surgir problemas com os seus recrutados para funções de gestão. Num próximo post, tratarei de falar um pouco sobre o papel do gestor de negócios. (Sobre este tema deixo-vos o livro "E-Myth" de Michael Gerber, sobre o qual ainda apenas li os reviews, mas que me foi muito recomendado como fonte de dicas sobre o que deve ser o papel de um gestor de negócios, e os mitos e erros associados as opções e decisões de muitos novos empreendedores.)

Por fim, ao gestor operacional cabe, no fim de ter planeado, organizado e dirigido, controlar que de facto aquilo que definiu está a ser executado. A ele cabe o importantíssimo papel de constantemente validar que se estão a executar os planos de acordo com a organização definida, e seguindo as suas direcções/decisões. E naturalmente, verificando que não se está a cumprir esse plano, há que se voltar ao início e implementar as correcções operacionais para que se regresse ao planeado.

A este gestor operacional, visto que ele dirige os "soldados", aqueles que estão em frente ao cliente no dia-a-dia, cabe um nível de preocupações muito transaccionais. Ele não pode parar a máquina para se retirar, reinventar a máquina, rever a estratégia definida. Ele tem que manter a máquina a funcionar!

Por isso, existe o gestor de segundo nível (o gestor de negócio, ou proprietário, etc). Cabe ao gestor operacional solicitar ao seu gestor de negócios os objectivos, direcções, e ferramentas e recursos que necessita para executar os planos definidos. É uma tarefa muito importante dele "escalar" aos níveis superiores aquilo que o afecta e que o impede de manter a máquina a funcionar.

Daqui já dá para começar a ter uma ideia de qual o papel do gestor de 2º nível...

Muitos problemas entre gestores de 1º e 2º nível surgem derivado de modelos organizacionais desadequados. Por exemplo, um gestor de 2º nível que lidere apenas 1 ou 2 gestores de primeiro nível, correrá o risco de ver os seus dias muito vazios, e caso venha de uma função de gestão operacional, cair na tentação de entrar na função dos seus liderados.

Mais informação sobre este tema, recomendo o livro "Becoming a Manager" da Linda Hill.

Por isso gestores de 1ª linha, ou gestores operacionais em pequenas de serviços, lembrem-se: planear, organizar, dirigir e controlar! Mas não se deixem perder no planear e organizar, pois a vossa função passa por fazer acontecer, e isso é dirigir e controlar, tarefas que deverão ocupar a grande maioria do vosso tempo.

Por isso sugestões: marquem reuniões regulares com o vosso manager para Planear; marquem reuniões de grupo com a vossa equipa para organizar; e façam pontos de situação individuais para dirigir e controlar.

Para os mais experientes, claro que isto não chega. Mas do que vejo da realidade, se executarem pelo menos isto, provavelmente os níveis de sucesso que alcançarão serão bem superiores aos actuais. Infelizmente, são demasiados os gestores de 1ª linha que vejo sem ter claro este seu papel, e que passam por muito stress e acabam baptizados de incompetentes fruto apenas de alguma falta de formação ou apoio dos seus managers de 2ª linha, a quem cabe a obrigação de os ajudar a perceber o que aqui vos digo.

Um grande abraço, e aguardo os vossos comentários, dicas e sugestões na página do facebook!

Podem adicionar-me "Angatu Guarini"; ou aderir ao grupo Gestão da Pequena Empresa.
Espero por vós lá!