domingo, 2 de outubro de 2011

Negócios em Franchising: Bom? Mau? Para quem?

Hoje estava aqui a rever os meus últimos anos de vida, e lembrei-me de uma conversa que recorrentemente vou tendo com alguns amigos mais próximos. Se hoje começasse de novo, utilizaria o franchising como porta de entrada no mundo empresarial?

E a minha resposta é… provavelmente não.

Mas mais importante é, porquê? Muitas vezes uma opção que é má ou errada para uma pessoa ou numa circunstância, poder ser boa para outra.

Neste post vou tentar estruturar a minha percepção do que é o franchising em Portugal, vantagens e inconvenientes, e para quem pode ser uma boa opção.

Para começar, alguns conceitos.

Quando queremos abrir um novo negócio, necessitamos de 3 ingredientes fundamentais:
  • Capital;
  • Conhecimento;
  • Trabalho.
Para se aspirar a ter sucesso, é de todo recomendável que o empreendedor tenha pelo menos 2 destes ingredientes. Ou caso tenha apenas um deles, que o tenha em grande abundância!

O franchising, na perspectiva de quem adere a uma rede existente, pretende preencher a componente de conhecimento.

No entanto, na perspectiva do franchisador, pretende resolver a questão do acesso ao capital e ao trabalho.
De facto o que ambos os lados procuram, na generalidade são coisas diferentes, e nem sempre isso é claro para ambas as partes logo no início da relação, o que é meio caminho andado para haver problemas mais à frente.

Mas, será que o franchising é a única fórmula para os pequenos empresários terem acesso ao conhecimento, e os grandes terem acesso ao trabalho e capital?



Sobre o conhecimento.

Na perspectiva do pequeno empresário, muitas vezes o franchising representa o que se considera ser um contexto mais seguro de acesso ao conhecimento. O modo tradicional de adquirir conhecimento num sector novo para quem não o tem, é contratar um consultor ou um profissional qualificado na área, ou até recrutar um sócio que traga essa valência, para que esses elementos ajudem a montar e estruturar o negócio.

Na generalidade dos casos, o risco de incorporar um sócio que mal se conhece é considerado excessivo. Devido em muito ao típico individualismo, mentalidade feudal da generalidade dos pequenos empresários portugueses, e imaturidade das boas práticas de governo empresarial em Portugal, o orgulho leva habitualmente para escolhas em que estejam sozinhos e não tenha que partilhar o poder.

Por outro lado no recrutamento de um consultor temos o desafio de conseguir arranjar boas referências de modo a não gastar dinheiro à toa, e a dificuldade de efectivamente o conseguir pagar.

Assim, o franchisador apresenta-se como um financiador desse conhecimento. Ou seja, ele ajuda o pequeno empresário a montar o seu negócio, e remunera-se sobre isso durante um conjunto de anos. E eu pergunto, o que sai mais barato? Adquirir um franchising ou recrutar um consultor?

Se formos a calcular os custos dos direitos de entrada e dos royalties ao longo do contrato de franquia a 5 anos, associado aos custos das oportunidades perdidas fruto das limitações que um contrato de franquia implica, eu creio que o franchising por regra sai bem mais caro.

Então porque é que tantas pessoas aderem a franchisings? Existe a ideia de que quem franchisa um negócio é mais credível, está mais estruturado, e é uma opção mais segura. Infelizmente esta não é a realidade, em que a generalidade dos franchisadores têm os seus conceitos pouco amadurecidos, os processos de transmissão de conhecimento mal estruturados, uma compreensão da concorrência e do mercado diminuta, e uma organização excessivamente amadora. Mas quem adere, não sabe isto, e perante as apresentações de powerpoint muito bem estruturadas, e os escritórios convenientemente alugados num local de prestígio, acabam por se ver inebriadas por uma encenação que lhes responde aos seus principais medos e ansiedades.

Tenho observado que os principais fornecedores de equipamentos específicos para um determinado sector de actividade têm demonstrado um maior conhecimento e capacidade de transmissão do mesmo, francamente superior à generalidade dos franchisadores. No entanto, quando se recorre e este tipo de entidades, há que efectivamente haver no empreendedor, um verdadeiro espírito empreendedor, e também aqui a realidade é que muitos dos novos pequenos empresários não são verdadeiros empreendedores.

Em conclusão sobre o acesso ao conhecimento: se o novo pequeno empresário é alguém criativo, com visão estratégica, orientado à acção, habituado a tomar decisões sozinho e assumir as responsabilidades das mesmas, e bom entendedor do mercado, então provavelmente o franchising não é mesmo a melhor opção. Se o novo empresário é alguém que foi empurrado para esta situação por exemplo devido a uma situação de desemprego involuntário, que é alguém habituado a seguir ordens, que necessita de suporte para conseguir tomar decisões, que sente a necessidade de partilhar responsabilidade nas decisões, com pouca vocação criativa e pouca orientação ao mercado, talvez o franchising seja de facto a opção certa.



Sobre o capital (na perspectiva de um franchisador).

Montar qualquer tipo de negócio exige à partida um certo volume de capital. Esse capital pode entrar na empresa por duas vias: dinheiro injectado por investidores, ou dinheiro emprestado por bancos.

Quando alguém tem uma ideia que realmente é boa, e tem a capacidade de a implementar com sucesso, pode dar mais ou menos trabalho, mas não demorará até encontrar candidatos disponíveis para financiar o crescimento dessa ideia.

O franchising surge como um modelo de financiar o crescimento do negócio. A lógica é: procuro futuros gestores operacionais para as unidades de negócio da minha empresa, em que os próprios financiam a construção dessas unidades de negócio, e remuneram o franchisador ao longo da vida da empresa.

Aderir a uma rede de franchising na perspectiva do pequeno empresário faz sentido se:
  • desejo ter o meu próprio negócio, mas não estou preparado para tomar decisões sozinho;
  • venho de um perfil operacional e não tenho capacidade de orientar estrategicamente a minha empresa;
  • não tenho base de conhecimentos nem perfil comportamental para desenhar um novo conceito de negócio de raiz;
  • procuro a segurança de continuar a ter uma figura hierarquicamente acima de mim que me oriente e apoie;
  • gosto de estar operacionalmente nas rédeas do negócio;
  • tenho um perfil fundamentalmente de vendas.
(NOTA: em nenhum dos pontos acima escrevi sobre capital… não foi distracção!)

Na perspectiva da pessoa que cria um conceito de negócio, franchisar o seu negócio faz sentido se:
  • não tenho vontade de liderar eu a expansão do negócio;
  • não consigo encontrar financiadores para o meu crescimento;
  • tenho dificuldades em montar e gerir um negócio geograficamente disperso;
  • não quero correr riscos financeiros na expansão do meu negócio;
  • quero crescer rapidamente e não tenho tempo para esperar o processo normal de amadurecimento de um conceito de negócio.
De facto, quando o empreendedor tem boas competências de gestão, tem um negócio bem estruturado, adopta uma estratégia de crescimento bem sustentada, há outros meios de aceder ao capital. É que para um franchisador, um dos grandes riscos é a falta de controlo sobre a qualidade de serviço, pois cada franchisado é uma entidade jurídica e financeira autónoma, e há sempre um espaço de autonomia no franchisado. Por isso ou escolhe efectivamente franchisados que sejam nitidamente “seguidores” ou terá imensos problemas.

Quanto decidi no passado aderir a um franchising, fi-lo conscientemente e por opção, na expectativa que a opção pelo franchising me trouxesse as seguintes coisas:
  1. Integração numa marca de referência;
  2. Inovação constante do modelo de negócio;
  3. Acesso a conhecimento de primeira linha naquele sector de actividade.
Infelizmente hoje constato que:
  1. A reputação da marca é a reputação da soma dos seus integrantes. Numa rede de franchising, havendo múltiplas entidades, acabaremos por ter uma reputação que em pouco depende de nós. Infelizmente não faltam franchisadores pouco éticos, e franchisados mal estruturados em termos técnicos e de valores, pelo que quem efectivamente quer fazer um bom trabalho, estruturado e numa perspectiva de médio longo prazo, rapidamente conclui que não basta aderir a uma marca que faça muita publicidade, pois mais crítico que isso é aderir a uma marca que crie e mantenha uma reputação excelente.
  2. A generalidade dos franchisings criam uma ideia e vivem à sua sombra por muitos anos. O esforço que representa gerir as tensões dentro da rede, bem como acompanhar um crescimento que habitualmente é alucinante deixa muito pouco tempo para efectivamente inovar o modelo de negócio, pelo que sendo o risco num modelo de franchising fundamentalmente do franchisado, o franchisador explora esta oportunidade até dar e rapidamente lhe vira as costas às primeiras dificuldades e parte para outra (excepção feita a algumas redes internacionais que se implantam em Portugal);
  3. O conhecimento gerado por vezes tem a ver com uma ideia de facto inovadora. No entanto, cada vez mais, o mercado copia e aperfeiçoa, pelo que se não houver uma gestão muito profissional e estruturada, rapidamente um conceito pode ser ultrapassado. Também, por regra, os planos de formação são frágeis, e efectivamente com o alargamento da rede, a capacidade de fazer o conhecimento chegar a toda a rede tende a perder-se.
Por tudo isto, hoje entendo que quer para um franchisador ou franchisado, ou seja, para qualquer indivíduo efectivamente empreendedor, o modelo de franchising como estratégia de crescimento, pode ser uma boa opção de curto prazo, mas habitualmente não é a melhor opção para quem quer desenvolver um modelo que passe ao teste do tempo.



Sobre o trabalho.


Efectivamente, esta é a grande variável quando estamos a falar de franchising.

É quando a variável trabalho é objecto de consenso entre franchisador e franchisado que a opção franchising faz sentido.

Dizia eu também no passado, que alguns franchisings podem ser uma opção para alguém que se posiciona como investidor. Hoje tenho que corrigir, que esta perspectiva de investidor só faz sentido num mercado que apresenta elevada liquidez (ou seja, quando alguém quer vender, existe sempre alguém que quer comprar), o que não é o que está a acontecer neste momento em Portugal e numa boa parte do mundo ocidental.

O franchising é de facto uma boa opção para quem procura auto-emprego. Ou seja, tenho algum dinheiro, quero ter o meu próprio local de trabalho em que possa ter mais escolhas sobre o meu dia-a-dia do que sendo apenas um empregado, e adiro ao franchising, em que encontro no franchisador o meu “chefe” que me orienta e controla, e em que a minha maior mais valia é estar diariamente e operacionalmente no negócio.

Neste cenário, há uma parte fundamental dos custos do negócio que ficam em casa (enquanto franchisado, sendo um dos elementos operacionais da empresa, é menos um salário que pago, e maior a rentabilidade que retiro do negócio).

Num momento em que o contexto é recessivo, esta opção do investidor ir para dentro da operação permite-lhe manter-se competitivo em termos de custos e superar a concorrência.


Conclusões.


O franchising é um bom modelo para quem procura uma oportunidade de auto-emprego e não tem a vontade ou capacidade de começar um projecto de raiz.

O franchising pode ser uma boa oportunidade de aprendizagem acerca do que é ser proprietário de um negócio, pelo que como primeira experiência não deve mobilizar a totalidade do capital do candidato a franchisado, e o mesmo não deve olhar para esta oportunidade como a única.

Franchisar um negócio pode ser uma boa opção para um território não prioritário de expansão, ou para crescimento rápido de um negócio sub-financiado.

Mas claramente o franchising não é a única nem a melhor opção para quem procura:
  • Conhecimento;
  • Capital;
  • Trabalho.
Alternativas:
  1. Conhecimento:
    1. Contrate como funcionário um profissional reputado no sector de actividade onde pretende entrar;
    2. Contrate um consultor especializado;
    3. Procure fornecedores desse sector que tenham serviços conexos.
  2. Capital:
    1. Procure um business angel ou um fundo de capital de risco;
    2. Arranje um sócio;
    3. Financie-se na banca;
    4. Financie-se com o sucesso e rentabilidade do seu próprio negócio.
  3. Trabalho:
    1. Desenvolva internamente os seus futuros quadros;
    2. Recrute em concorrentes;
    3. Recrute em sectores diferentes mas em que os requisitos comportamentais sejam semelhantes ou compatíveis.
O franchising é bom se efectivamente o que ele oferece corresponder ao que você procura. No entanto, e infelizmente, muitas vezes tenta-se vender o franchising por coisas que ele não é.

Leia muito, estude muito, procure conselhos, e sobre tudo, não deixe de falar com muitas pessoas que já tenham passado pela experiência perguntando-lhes efectivamente o que obtiveram de bom, e o que perderam nesta experiência. Perguntem-lhes o que de facto se confirmou face as expectativas iniciais, e o que ficou aquém. Perguntem-lhes o que fariam de diferente.

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Eu por mim, valorizo o facto de ter tido experiências em franchising, mas para mim chega. A falta de liberdade que a experiência de ser franchisado representa, não é compatível com o meu perfil.

Num momento de crise, mais que nunca, estamos entregues a nós.

Muitos franchisadores não estão minimamente preparados para lidar com mudanças estruturais no mercado e contextos recessivos. Muitas das suas soluções não se adequam ao momento em que como país, Portugal está a viver neste momento. E quem paga as contas é o franchisado. Se o franchisador fizer uma opção menos correcta, quem se trama é o franchisado.

Os franchisadores são humanos como todos os restantes, e por isso também erram. Lamentavelmente tenho verificado que a grande maioria tem uma enorme dificuldade em assumir os seus erros (até porque isso pode dar processos em tribunal por parte de franchisados ou representar perdas repentinas de receitas). Isso impede na generalidade dos casos que efectivamente um franchisado possa influir no caminho seguido por uma determinada rede de franchising, o que se agrava com o crescimento dessa rede.

Quer aderir a uma rede de franchising? Força. Mas vá consciente de que terá o seu destino na mão de outros, que a responsabilidade financeira e legal é inteiramente sua, tenha a certeza de que o que efectivamente procura é uma situação de auto-emprego.

E não coloque toda a sua capacidade financeira neste projecto – guarde sempre algum fundo de maneio!

Mais que tudo, assegure logo à entrada uma estratégia de saída.

Espero que estas ideias ajudem nas vossas opções!

1 abraço, Angatú (Pseudónimo)