quarta-feira, 17 de março de 2010

O estado (entidades públicas) para as pequenas empresas

Falava eu com um amigo, que por acaso é natural de um outro país Europeu lá mais para o norte.

Durante a conversa desabafei que uma das minhas principais ocupações enquanto gestor e empreendedor, era garantir que o estado não me levava à falência. Que os requisitos são tantos, de tantas entidades, e inspeccionados por outros tantos, com multas tão pesadas, e o aparelho de estado dificulta tanto a vida a quem quer cumprir...

Resumindo nas palavras dele: mas o estado não está ao teu lado para te ajudar a ter sucesso??? Como se isso fosse absolutamente inquestionável.

Ao que tive que responder: não, infelizmente não. Tenho que confessar que o estado Português é presente sobretudo como carrasco à procura de algo para te tramar. A postura da grande maioria dos seus funcionários é de quem te faz um favor só em te ouvir, e que o seu papel é apanhar e punir todos os que não conseguem cumprir os imensos requisitos que este lhe impõe.

Contei-lhe um exemplo: para solicitar fundos públicos de apoio à criação do próprio emprego, e exigido que exista um espaço comprometido à data em que se der entrada no processo. Este processo pode chegar a levar 1 ano a ter resposta. Será que algum senhorio mantem um espaço para arrendar um ano sem receber renda? Será que alguém que está desempregado consegue pagar 1 ano de renda à espera dos apoios públicos de criação do próprio emprego? E quando vamos aos serviços publicos pedir apoio, deparamos com um beco sem saida. Ninguém sabe, ninguém responde, e dizem que se quiser temos que esperar (e surpreendem-se de os programas públicos de incentivos a empresas estarem brutalmente SUB-executados).

Outro exemplo: uma empresa abriu uma actividade cujo licenciamento publico tem levado cerca de 2 anos. Se abrir sem licença, pode pagar multas monumentais e fechar a porta por não conseguir suportar a pressão financeira. Se quiser cumprir a lei, o peso de 2 anos de rendas sem receitas é de tal modo pesado, que mata o projecto de investimento antes mesmo de abrir.

Então? Como fazem no teu país para abrir empresas?

Respondi-lhe que tenho recebido sugestões em 2 sentidos. Uma possibilidade passa por abrir rapidamente e sem todos os requisitos legais necessários, confiar na incapacidade do estado de fiscalizar, e arriscar. Outra possibilidade é "pagar" as pessoas certas para que não hajam fiscalizações.

Porque o processo ser lento é garantido em qualquer dos casos.

Então perguntei-lhe: e no teu país como é?

E dizia-me ele: lá temos gabinetes de apoio às empresas, que promovem o empreendedorismo, apoiam na obtenção de funtos públicos e comunitarios, dão formação e acompanhamento, e funcionam como elo de ligação com o estado no sentido de nos orientar pelos tramites legais e pelos melhores caminhos com vista ao sucesso. São autenticos consultores a trabalhar para te ajudar. O estado está lá em primeiro lugar para nos ajudar e orientar, e só depois para confirmar que fizemos as coisas bem, e caso seja necessário punir os incumpridores. Mas a confiança no sistema de justiça é tal, que geralmente se cumpre.

A conversa durou algumas horas e cheguei à conclusão: realmente abrir uma empresa hoje em Portugal é uma verdadeira aventura de alto risco. Isto claro, para os pequenos empresários sem capacidade financeira para pagar as pessoas certas, ou sem amigos nos sitios certos.

Se este estado de coisas não mudar, como esperar uma saida sustentada do buraco de pessimismo em que este país está mergulhado?

É impensável para investidores de certos países investir em Portugal se verificam que a moldura legal é pantanosa, o sistema público é excessivamente burocrático, a atitude das entidades públicas é de carrasco, o sistema de justiça não funciona, e a corrupção abunda...

Só mesmo nós que amamos este país, que aqui nascemos e crescemos, e que teimosamente continuamos a querer fazer dele um lugar de futuro para nós e os nossos filhos é que somos corajosos o suficiente para cá desenvolver novos projectos de investimento.

1ª barreira ao desenvolvimento económico Português: uma justiça que não funciona porque ou não responde, ou responde tardiamente, e que assim beneficia o incumpridor.
Estão criadas as condições para a mais violenta selva empresarial, em que é o salve-se quem puder.

Um contexto assim dá confiança para projectos de investimento estruturantes com retornos esperados nunca antes de 8, 10 ou 15 anos???

Gostaria de vos deixar aqui um caminho de como fazer, mas não tenho respostas concretas.
Apenas vos posso dizer qual foi a minha opção: agir de acordo com os mais rigorosos princípios éticos sobre os quais os meus pais me educaram, tentar cumprir todas as obrigações legais, e ter esperança que se um dia tiver problemas de alguma ordem, as decisões fiquem nas mãos de alguém correcto para quem os dois aspectos anteriores pesem na decisão pela minha sobrevivência.

É uma formula de sucesso garantido para investir em Portugal? Não. Mas é a única que consigo conceber à luz da minha esperança de que este país encontre o seu rumo, em que a justiça começe a funcionar, o estado passe a existir para ajudar os cidadãos e as empresas, e a corrupção seja violenta e frontalmente combatida.

Sem comentários:

Enviar um comentário