sábado, 12 de maio de 2012

Desabafo sobre o peso do estado (impostos) na vida das pequenas empresas em Portugal

Fui multado! Senti-me abandonado, roubado, violado. Estou revoltado...

Fora do contexto habitual das minhas publicações, mas tinha que deixar escrito para memória futura tudo o que me passou pela cabeça hoje.

Em resumo, perdi a cabeça e fui ameaçado de prisão por um agente da autoridade.

Quem me conheçe, sabe bem que sou uma pessoa muito tranquila e tolerante, mas acho que hoje (como dizem os nossos irmãos brasileiros), o saco encheu!

Muito tenho escrito sobre a realidade do pequeno empreendedor em Portugal, e muito tenho escrito sobre a minha fé no futuro de Portugal. Mas começo a ficar sem argumentos para defender mais o actual estado de coisas.

São demasiadas provocações em muito pouco tempo.

Ora vamos ao contexto. Nos últimos 2 anos em Portugal:
  • O IVA subiu, em alguns sectores 283% !!! Sim, não me enganei nas contas. Um imposto directo sobre o consumo que sobe 283%. Acham normal em qualquer país desenvolvido???
  • Mas de isso não bastasse, subiram também as taxas imputáveis às empresas (taxas municipais de licenciamentos e outras);
  • Subiu o custo da água (no meu caso, por alteração legislativa tivemos um aumento de 90% relativo à criação de uma taxa de resíduos de valor equivalente a 90% do valor do meu custo de consumo de águas);
  • Subiu a electricidade (na medida em que tenho um negócio Isento de IVA, logo não posso deduzir o IVA pago nos fornecimentos) o que derivado do aumento do IVA representou um aumento de 19%;
  • O crédito bancário reduziu-se em mais de 60% (na medida em que nos meus negócios vendo bens e serviços de balor médio entre poucas centenas e alguns milhares de Euros, a perda desta alavancagem por via da alteração dos critérios de valiação de risco dos bancos por um lado, e da regulamentação por outro, implicou uma perda de receitas na ordem dos 2 dígitos);
  • Os custos do crédito bancário à minha empresa subiram 78% !!! Sim, também não me enganei. Quando abri a minha empresa em 2007, sendo uma start-up sem qualquer histórico bancário, e logo de risco elevado pagava um juro efectivo (Euribor + spread) na ordem dos 4,5%, enquanto hoje, para financiar a minha tesouraria e manter a empresa neste período de crise na expectativa de um crescimento futuro, só de spread os bancos estão a pedir na ordem 7%, o que somado a uma Euribor de 1%, dá um juro efectivo na ordem dos 8%;
  • Houve outros impostos que subiram, que não me afectando directamente, afectam indirectamente, como sejam os impostos sobre o trabalho, que significam que com o mesmo custo, os meus funcionários levam menos dinheiro para casa, o que inquestionávelmente coloca pressão sobre a relação trabalhador empregado, na medida em que eu (como eles) vejo os meus custos pessoais a subir (subida dos combustíveis e portagens levaram a um aumento de cerca de 30% dos meus custos de deslocação, na medida em que tenho que fazer 50 km para cada lado para me deslocar até às minhas empresas, e mesmo que quisesse ir morar mais perdo delas, neste momento ninguém combra a minha casa o que me obriga a manter residência onde estou actualmente).
  • Há a somar a isto o aumento dos impostos sobre o imobiliário (o imposto que pago anualmente por ter uma casa própria), o qual não tendo um aumento significativo em termos nominais, tem vindo a aumentar a 2 dígitos fruto dos processos de reavaliação que o estado tem estado a promover (este imposto é uma percentagem sobre o valor patrimoniar do imóvel).
Esta é uma lista apenas de exemplo, que não reflecte nem 10% de todos os aumentos de custos directa ou indirectamente de origem fiscal!!!

Ou seja, tudo isto, já coloca desafios significativos à manutenção do equilibrio financeiro de uma empresa, na medida em que tudo isto aconteceu condensado em menos de 2 anos.

Para além de tudo isto, não fossem estes motivos suficientes para abanar a motivação de qualquer pequeno empresário, temos ainda os serviços de fiscalização do estado mais zelozos que nunca.

Vivemos num país com excesso de regulamentação, completamente exagerado para o nosso nível de desenvolvimento (ver o meu post de Junho de 2011: Regulação, Burocracia e Corrupçao), em que a quantidade de legislação já existente aplicável a uma micro empresa (abaixo de 1.000.000 Euros de facturação anual), a sua dispersão e a velocidade a que aparecem novas regras, torna impossível a uma qualquer empresa cumprir com tudo, pela impossibilidade material de conhecer tudo o que aparece de novo e de suportar os custos materiais e humanos de conseguir responder a tudo dentro dos prazos indicanos nessa mesma legislação.

Este absurdo, em meu ver deve-se ao facto de cada organizmo do estado, na sua voracidade de mostrar trabalho, isoladamente se apressar a produzir regras, e a tentar obter o máximo de receitas de forma a poder fugir do plano de cortes do governo.

O que para além de todo o aumento dos impostos, significa adicionalmente um custo de multas e penalidades e um custo burocrático (horas pagas a advogados, arquitectos, contabilistas, taxas administrativas pagas contra qualquer papel que se entrege numa repartição pública, somado às horas que o próprio micro-empresário perde em filas, telefonemas e trocas de correspondencias), que afogam completamente a capacidade da empresa em inovar e se desenvolver.

Acho tudo isto muito injusto para aqueles que sendo de origens humildes, juntaram as suas poucas poupanças e se empenharam perante a banca e o estado para conseguir criar emprego neste país.

Acho ainda mais injunto, quando o estado não espera 1 único dia para se remunerar, e aplica multas substanciais caso haja um atraso (exemplo, pagamentos de IRS, IVA, Taxa Social Única, IRC, IMI, etc), para além de nestes casos ser excessívamente ágil a penhorar o contribuinte, contribuindo de forma ainda mais acelerada para a sua ruptura (e consequente aumento do desemprego), não mostrando nos seus diversos interlocutores qualquer flexibilidade, tolerância ou compaixão pelos pequenos empresarios, que chegam a passar dificuldades na sua vida pessoal, de forma a conseguirem honrar os compromissos com os seus funcionários e assegurar-lhes os pagamentos dos salários.

E daí, hoje perdi a cabeça. Perdi a cabeça com um polícia excessivamente zeloso, que, num local onde não há qualquer espaço para cargas e descargas, onde eu fui para deixar algumas roupas na lavandaria, se apressou no tempo de eu entrar e sair, em me aplicar uma multa. Foi uma coisa quase sem significado, mas foi a gota de água que fez transbordar a minha paciencia.

Coitado, perante a minha fúria, disse que eram apenas 30 Euros, mas respondi-lhe que eram mais 30 Euros a somar a todos os milhares que o estado me tem levado nestes últimos anos.

Retorquiu ele, mas há sitios adequados para reclamar disso, e nesse momento entendi perfeitamente o que se passa na Grécia, e percebi como falta apenas uma pequena faísca para acender o rastilho da revolta em Portugal.

Entendi, que eu enquanto cidadão, não tenho ninguém a quem recorrer. Fazer queixa ao provedor de justiça??? O que poderá ele fazer, na medida em que este assalto descarado e absurdo de que tenho sido vítima por parte do estado é feito ao abrigo de legislação aprovada na assembleia da república??? Este é um roubo legalizado, pelo que efectivamente, naquele momento, em frente aquele polícia, percebi que não tenho a quem recorrer por socorro.

Na minha mente criou-se o estado de espírito dos aldeões da época medieval, que se revoltavam pelos nobres lhes levarem tudo o que produziam em impostos. Veio à minha mente a razão para o surgimento de personagens míticos como o "Robin Wood". Compreendi porque algumas pessoas fazem as opções mais radicais, simplesmente porque estão num beco sem saída:
  • viver à margem da lei e da organização do estado;
  • lutar contra o estado, por vias não convencionais na medida em que as instituições e organismos dependentes do estado existem para o defender;
  • ou simplesmente amandonar este espaço geográfico em que este estado ordena, e procurar outro local a que chamar casa.
Ninguém entenda esta minha narrativa como uma crítica política contra um governante A ou B, contra um partido político C ou D. Sobretudo na medida em que os partidos não são mais que a imagem da sociedade em que vivemos.

A minha crítica vai para este modelo social em que vivemos, que embora muitos chamem democracia, na minha avaliação continua a ser apenas um feudalismo.

Feudalismo do estado composto por uma massa de pessoas focadas em apenas se servir a si e aos seus à custa de todos os outros (que ascendem ao poder por via do seguidismo partidário), o feudalismo das elites dos grupos de influências obscuros, e das relações ocultas entre bandos que se alimentam mutuamente... tudo isto à custa do povo. Povo, que denomino por aqueles anónimos, abstratos, cujo único grupo de influencia a que pertencem é a sua família mais próxima, na qual buscam apoio para não lhes faltar a comida na mesa.

E denuncio!!!
  • Denuncios os casos de dirigentes de organismos publicos que manipulam processos de contratação para arranjar empregos aos seus grupos de interesse, muitas vezes contratando pessoas de capacidade ou competência nula para as funções em que se integram, muitas vezes criando funções na organização perfeitamente inúteis apenas para arranjar espaço para mais uns compadres;
  • Denuncio os concursos publicos viciados e manipulados (o que é de conhecimento de todos mas ninguém tem a coragem de assumir), com o objectivo de dar certo contrato ou fornecimento à empresa de A ou B;
  • Denuncio as trocas de favores que nem sequer são conveniente disfarçados, em que por determinado dirigente publico beneficiar alguém, depois acontece que um primo, tio, filho, irmão, etc surpreendentemente acabam por ser contratados em cargos muito bem remunerados nas empresas dos beneficiados, ou recebem bens em seu nome cuja origem não é o seu mérito ou trabalho, ou têm acesso à compra de bens muito abaixo do seu preço de mercado como forma de realizarem supostas mais valias "lícitas".
Os esquemas são tantos, tão conhecidos, alguns tão descarados, que demonstra de facto uma consciencia da impunidade em que tudo isto consegue ser feito no nosso pequeno país. Toda a gente sabe que acontece, mas ninguém "consegue provar" !?!?!?

Tudo isto é ainda mais revoltante, que alguém que verdadeiramente foi injustiçado, dificilmente conseguirá justiça junto dos tribunais portugueses, pois se verá perdido em questões processuais que custarão verbas imensas sem qualquer garantia de um resultado justo, o que por sua vez protege os infractores, pois neste sistema judicial, só se condena algém de for apanhado em flagrante, isto claro na condição de quem o apanhou em flagrante o ter feito de forma "processualmente correcta", sob risco de essa evidência se tornar inválida (ao abrigo de um suposto principio de salvaguarda de direitos e garantias fundamentais, como a presunção de inocência até prova em contrário que apenas acaba por protegem o criminoso).

Este estado altamente regulamentado, proteccionista de todos e quaisquer direitos, e este sistema de justiça que simplesmente só serve para declarar a inocência dos "senhores do sistema" por tecnicalidades processuais, não tem espaço para pessoas que tenham sido educadas numa base de valores e princípios como a ética, a transparência, o mérito de crescer pelo seu trabalho, a tolerância, a solidariedade, o altruismo, e o desejo apenas de prover o suficiente para si e os seus, e que não se mobilizam pela soberba do poder e do acumular de posses.

A minha vontade??? Destruir sem dó nem piedade o sistema actual que descrevi nas minhas linhas acima, e participar na implementação de um sistema, em primeiro lugar moral, que efectivamente se reja pelo que eu aprendi serem os fundamentos da economia: o bem estar social - o qual entendo claramente como o bem estar da generalidade da população, o que se tem obrigatoriamente que traduzir na garantia do que considero serem os 3 pilares fundamentais da humanidade:
  1. O direito de cada ser humano em se sentir útil, assegurado através do acesso ao trabalho que assegure a possibilidade de aspiração a uma condição melhor por via da dedicação e do mérito individual;
  2. O direito de cada ser humano em se incluir num grupo social, em que seja respeitado pelos seus valores morais e pelo seu contributo para a melhoria do bem estar dos outros num verdadeiro espírito altruista;
  3. O direito de cada ser humano em amar e ser amado, num verdadeiro sentido de amor incondicional familiar, em que o núcleo familiar o qual é o pilar base da sociedade, seja um espaço de desenvolvimento pessoal, respeito, autoconhecimento e tolerância, e consequêntemente um espaço de cultivo de valores morais e éticos no qual o desenvolvimento equilibrado das gerações futuras assente.
Aqui, claramente, entendo o serviço público não como um caminho para fazer carreira, conhecer as pessoas certas, e conseguir sem mérito ter bens e poder, mas sim como um espaço altruista de pessoas de elevados valores morais e éticos que disponibilizam o seu tempo, trabalho e conhecimento, sem qualquer contrapartida pessoal, para contribuir para a melhoria do bem estar geral.

Em conclusão, face a não ver qualquer capacidade de isto vir a acontecer de forma pacífica e voluntária, e observando a história, o caminho que vejo para Portugal e para a Europa, é um caminho de rupturas violentas e profundas, que podendo não se materializar numa guerra convencional, estou crente que poderá vir a significar um crescimento exponencial de insurgimento popular por toda a Europa contra esta Europa Feudal dos senhores do sistema e dos mercados, e que acredido tomará formas muito explícitas de violência, as quais não sendo o caminho que os meus pais me ensinaram, hoje aceito como uma solução inevítável para aqueles que como eu se vêm sem hipótese de recurso, na medida em que as instituições existentes acabam por se revelam meros mecanismos de defesa das opções do estado, por muito injustas que elas sejam.

Uma última palávra para os partidos políticos. Achei num primeiro momento que a solução deveria passar por uma maior participação do povo nos partidos políticos. No entanto, os partidos são também constituidos por pessoas. E infelizmente, um número importante de pessoas que hoje participam na vida activa dos partidos estão lá para se servirem a si, e não para servir os outros, pelo que aqui, mais uma vez, independentemente do mérito pessoal de um ou outro dirigente, não vejo capacidade na organização política actual para resolver os graves problemas que afectam a sociedade, na medida em que em minha opinião, a própria logica do funcionamento e organização partidária, é parte do problema na medida em que alimenta essa cultura corporativista de associação para o mérito de alguns à custa de todos os outros.

Assim, o único passo que vejo como possível para a realização de uma mudança estrutural na sociedade Portuguesa de forma pacífica, é a realização total da democracia, por via da possibilitação de candidaturas pessoais (individuais e sem filiação partidária) para todos os cargos políticos do estado (mas de imediato para presidente de junta de freguesia, presidente de câmara, e deputado), em que os candidatos vençam pelo seu mérito pessoal (em circulos uninominais) e possam, um a um, fruto da legitimidade que lhes é conferido pelo voto pessoal e directo do povo, possam operar uma limpesa no sistema público Português.

Para que não hajam dúvidas na interpretação das minhas palavras, em termos de convicções, tenho uma base de educação cristã, democrata, que tipicamente se associa às idiologias de direita, mas ouço cada vez mais os meus amigos a dizer que tenho um discurso de esquerda. Não defendo o medianismo, o proteccionismo, o corporativismo, os direitos sem obrigações que vejo habitualmente nos discursos dos dirigentes de esquerda em Portugal. Mas isto também não significa que defenda incondicionalmente todas as ideias de um qualquer partido. Tenho as minhas próprias ideias, com as quais estarei disponível para contribuir sempre que encontrar um contexto democrático em que as minhas ideias queiram ser ouvidas, e com as quais eu contribua para a construção de uma nova ideia de organização política e de país, que sei não será a minha visão, mas sim a conjunção das ideias de todos os seus contribuintes num verdadeiro exercício de encontro democrático.
1 Abraço do Angatú (que por este caminho, atravessará o atlântico para o nosso país irmão Brasil, mais cedo do que esperaria).

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