terça-feira, 31 de maio de 2011

Portugal: a necessidade vital de produzir

Muito se tem escrito e comentado sobre a situação Portuguesa e o grave nível de endividamento que hoje amarra o país.

Não se tem dito tanto quanto seria necessário sobre a responsabilidade dos nossos "parceiros" na construção Europeia, acerca da sua responsabilidade na situação que Portugal e outros países periféricos hoje vivem.

Dizia um professor meu de "geo-política e geo-estratégia", participante de primeira linha na entrada de Portugal para a CEE - Comunidade Económica Europeia (infelizmente falecido recentemente): "a principal motivação dos países do centro da Europa para o convite à adesão de países como Portugal, baseava-se na necessidade de abrir novos mercados à colocação dos seus produtos, e por essa forma, sustentar o aumento do nível de vida dos seus eleitores baseado num crescimento acentuado da sua balança comercial".

Dizia ainda ele, que à data, os países do sul da Europa, apresentavam indices de fertilidade (filhos por mulher) muito acima da média do centro da Europa, e uma estrutura produtiva obsoleta e incapaz de competir num mercado aberto. Com estes aspectos combinados, tais países representavam uma excelente oportunidade: pela subsidiação da melhoria do nível de vida das suas populações, e na expectativa de manutenção das taxas de fertilidade observadas, esses países observariam melhorias substanciais do seu nível de vida, abrindo oportunidades de consumo para as forças produtivas dos países fundadores da CEE.

A médio prazo, e no pressuposto da manutenção desses índices de fertilidade, o boom do consumo interno alavancaria um sector de serviços (necessariamente de proximidade) que sustentariam as necessidades de emprego desses países, concentrando-se a força produtiva nos países fundadores da CEE, mais capacitados industrialmente, mais modernos e cada vez com maiores economias de escala.

Do lado de Portugal, a expectativa de muitos governantes à data, embora não podesse ser publicamente assumida por questões nacionalistas e eleitorais, era que a Europa caminhasse no caminho Federativo, em que mecanismos de compensação financeira dos países produtores garantiriam o equilibrio das contas nacionais dos "estados federados" consumidores.

Podemos dizer, que esta situação agradaria a gregos e troianos!

O que ninguém esperava eram 3 coisas:
   - que com a melhoria do nível de vida, o indice de fertilidade nos novos paises da união evoluisse no mesmo sentido já observado nos países mais desenvolvidos do centro da Europa, ou seja, que caísse a pique a níveis inferiores aos observados no norte e centro da Europa, e que com esta queda, o esperado boom populacional que alavancaria um consumo interno nesses países a médio prazo, não se viria a verificar;
   - que os países que subsidiaram a morte da generalidade dos sectores produtivos nos novos países aderentes, perante a evidencia do descréscimo populacional, se refutassem ao pagamento da factura da dependencia criada;
   - que ao longo da construção europeia, os governantes actuais, meros burocratas desprovidos de uma visão de europa e da capacidade de a defender, fossem oscilando nas opções políticas de circunstancia, esquecendo o que no inicio fez ambos os lados desejar esta união: os países periféricos, e os países do centro da Europa.

No processo de construção Europeia, Portugal foi demasiado bom aluno, sendo "mais fundamentalista que o Pápa". Internamente foram criadas mais barreiras à produção que na generalidade dos países Europeus, e foi-se mais ´longe na liberalização do livre transito de pessoas e bens que na generalidade dos estados Europeus.

Nós, enquanto país sub-desenvolvido e despreparado para competir nas áreas que representavam o maior volume da nossa economia, abrimos a porta à entrada livre do produtores europeus, matando aquilo que as politicas comunitárias não tinham ainda determinado à morte.

Desde a política agrícula comum, as cotas de pescas, os concursos publicos internacionais, a importação de todas as regras e normas de instalação e operação das empresas preparadas numa europa central de grande escala e que levou ao encerramento por incumprimento de inúmeras pequenas e micro-empresas nacionais...

Outros, como por exemplo a nossa visinha Espanha, foram piores alunos. É do conhecimento geral que as empresas, governo central e autonomias Espanholas, criam imensas barreiras à entrada de empresas estrangeiras. Encontraram-se maneiras criativas de garantir que as unicas empresas capazes de ganhar os consursos eram na generalidade empresas espanholas. Piores alunos ainda, foram os países fundadores, que ditaram regras, que nas suas componentes restritivas foram mais rapidamente implementadas e adoptadas nos pequenos países desejantes de mostrar bons alunos, do que nos grandes fundadores que deveriam ser o exemplo.

Como conslusão deste diagnóstico, dou-vos a seguinte pergunta: já fizeram uma análise comparativa entre a evolução das balanças comerciais cruzadas entre os diversos países Europeus??? Apenas uma dica: observem a relação entre a evolução positiva por exemplo da balança comercial Alemã e a Grega...

Não querendo criar cisões na União Europeia, não consigo deixar de que os Portugueses se endividaram a consumir produtos produzidos na Alemanha, contribuindo assim para a melhoria dos níveis de vida dos cidadãos deste último país.

Mas os Portugueses coitadinhos são apenas umas vítimas??? Não! Também fizeram por si muitas opções erradas. Mas a situação em que se encontram tem muita resposabilidade dos países do centro da Europa. Esses países levaram-nos ao colo a esta situação, e nós deixámos.

Esta situação era previsivel, e muitos alertaram para ela em Portugal. Lembro-me de multiplos comentários na década de 90 acerca das consequências nefastas a médio prazo, que as opções tomadas representariam. Havia a expectativa dos principais líderes políticos, que os mecanismos de solidariedade da União (entendam-se fundos europeus - ou de forma mais simplista o dinheiro injectado pela união para subsidiar o nosso consumo) fossem sendo ajustados à nova realidade.

A demografia lixou isto tudo. O país não pára de envelhecer, a população estagnou havendo cada vez menos nascimentos, isto pôs uma pressão extrema sobre os sistemas de saúde e segurança social, e com a ajuda de um despesismo despropositado no betão, arruinou de vez as nossas contas.

E agora, a solidariedade Europeia deu-nos um "toma la!". Os governantes Europeus de hoje, expostos ao excrutínio em tempo real na Internet, já não podem dizer uma coisa dentro dos seus países, e depois fazer outra na União Europeia. Agora tudo o que dizem influencia a sua capacidade de atrair os votos internos, e afinal são os seus cidadãos nacionais que os elegem. Ainda por cima, com o déficit de lideres que a europa observa, em que proliferam os burocratas, só podia dar a situação em que hoje a Europa se encontra.

Estamos numa verdadeira encruzilhada e esta encruzilhada coloca apenas uma pergunta:
   - queremos todos nós europeus continuar no caminho de construção de uma Federação de Estados, tal como sonhado pelos políticos fundadores?

Se sim, o caminho terá obrigatoriamente por aprofundar os mecanismos da União, por exemplo garantindo a cobertura total das dívidas soberanas dos países periféricos.

Se não, vejo a entrada irreversível num caminho de desmembramento da união "pan-europeia", e o resurgimento de tensões entre ricos e probres.

No meio disto tudo, uma coisa é certa. Ninguém resolverá os nossos problemas por nós, e não acho aconselhável ficarmos à espera que nos continuem a pagar para não produzir nada... pois já sabemos que mais cedo ou mais tarde nos apresentarão a factura.

Na nossa adesão à união, matámos a vaca, e ficamos sem o leite. Neste momento é imperativo que voltemos a ter vacas.

Ou seja, destruimos tudo o que tinhamos de produtivo nos sectores primário e secundário por uns dinheiros, que rapidamente se acabaram. Agora que percebemos os erros que cometemos, o caminho inevitável é investir sem hesitações na recuperação de todo o tecido produtivo e transformador, e criar o máximo de barreiras à entrada de produtos que internamente tenhamos capacidade de produzir.

Aqui temos o garrote do empréstimo que estamos a negociar, que exige a redução ainda maior das limitações à livre concorrencia trans-nacional....

Teremos simplesmente que ser tão criativos como a nossa visinha Espanha tem sido.

Uma ideia: porque não o governo Português apenas autorizar a aquisição de viaturas fabricadas em unidades de produção nacionais??? Passavamos todos a andar de carritos que até são jeitosos, e garantiamos que o absurdo que hoje o estado gasta em carros produzidos no centro da europa contribui para a melhoria do nível de mais Portugueses que apenas os vendedores de autómóveis.

Uns dirão que não podemos fazer isso. Eu digo que precisamos de ser criativos no sentido de encontrar uma maneira de o fazer acontecer.

Outra ideia: em vez de pagar "Rendimentos Mínimos" a quem está sem actividade profissional, porque não pagar-lhe esse mesmo subsídio com a condição de trabalhar em produções agrícolas?

Temos que deixar de ser os bons alunos apenas naquilo que é para nos tramar, para espartilhar as pequenas empresas em burocracias asfixiantes e desproporcionadas. Temos também que ser bons alunos nos meios de, dentro das liberdades das regras existentes, promover o fazer florescer o que é nacional.

Se os nossos "parceiros europeus" não querem pagar as nossas dívidas, terão obrigatoriamente que fechar os olhos a estas coisas, pois não há outro modo de nos tirar desta espiral negativa que enquanto países entrámos.

Obrigar ao empobrecimento das populações periféricas, dará espaço ao surgimento de movimentos radicais nacionalistas e ao surgimento de tensões dentro da união, que na história passada geraram conflictos épicos. Não acredito que haja uma terceira guerra mundial a começar na Europa, mas acredito que se nada for feito, com o rumo actual de acontecimentos, caminharemos para uma situação de guerrilhas localizadas, aumento da violencia e do crime, insurgimentos populares, que inevitavelmente colocarão nos governos dos países partidos nacionalistas e radicais.

Será que os nossos parceiros do Centro da Europa qerem pagar para ver?

Abraço!
Angatú